Meu filho não fala. E agora?

  
Atenção a esse sinal! Ele pode ser um sintoma de algo mais sério, como autismo ou surdez

Por Jéssie Panegassi / Ilustrações: Melissa Lagôa


Ilustração: Melissa Lagôa
Na tarde de Natal de 2010, a fonoaudióloga Noemi Gomes recebeu um ótimo presente. A partir daquele dia teria junto de si um filho. A festa estava completa. Juan, com 3 anos na época, foi logo adotado por toda a família. Contudo, a mamãe e o papai já haviam notado a dificuldade do menino em se comunicar. Ele não falava palavras completas, muito menos frases, embora tivesse idade suficiente para tanto. Noemi sabia que isso poderia significar algum problema.
Mesmo no abrigo onde Juan vivia, que só aceita crianças de até 4 anos, já haviam sido realizados exames para verificar a existência de alguma possível doença. Ele ainda usava fraldas, não conseguia comer sozinho e a comunicação era extremamente difícil, uma vez que não falava. Mesmo com três anos e dois meses, a mãe afirma que o seu desenvolvimento era similar ao de uma criança com um ano e meio de idade.
Quando começaram a se conhecer, ela descartou a possibilidade de autismo. O menino fazia contato com os olhos, mostrava que entendia o que lhe falavam e aceitava ser tocado, o que descaracteriza essa doença. Noemi não traçou nenhum "plano de ação" com o seu filho. Ela acreditava que apenas com o estímulo correto ele se desenvolveria normalmente. A partir desta convicção, ela passou a lhe dar bastante carinho e estimulá-lo em momentos simples, como no banho, na hora de comer ou durante as brincadeiras. Com isso, ele passou a se desenvolver rapidamente.

A aprendizagem da fala ocorre em tempos diferentes para cada criança. Porém, deixar de realizar essa atividade no prazo médio não é sinal de alguma doença

Ilustração: Melissa Lagôa
Quando procurar ajuda
"Começar a falar faz parte de um desenvolvimento global chamado de neuropsicomotor", ensina Paulo Breinis, neuropediatra do Hospital e Maternidade São Luiz (SP). "É esperado que as crianças comecem a falar palavras isoladas entre um ano e um ano e meio de idade. Já as frases completas devem ser pronunciadas entre dois anos e meio e três anos", afirma Ana Luiza Navas, professora do curso de fonoaudiologia da Santa Casa de São Paulo.
Apesar disso, esse processo ocorre em um tempo diferente para cada criança, e não realizar essas atividades no prazo médio não é necessariamente sinal de uma doença. No entanto, "se a criança não começar a falar até os 2 anos, ela deve ser encaminhada para pesquisas e exames fonoaudiológicos", alerta Sylvio Renan Monteiro de Barros, pediatra e autor do livro Seu bebê em perguntas e respostas (MG Editores). A fonoaudióloga e o pediatra concordam que, apesar de não ser uma regra, é comum que as meninas se desenvolvam antes dos meninos - inclusive na hora de dizer as primeiras palavras.



Os principais fatores que interferem no processo da fala são surdez, doenças de faringe e laringe, autismo e problemas psicológicos

Os possíveis diagnósticos
Os especialistas concordam que o primeiro ponto a ser analisado é se a criança consegue escutar e entender o que está sendo dito. "Muitas vezes ela até consegue falar algumas palavras, mas não com todos os sons que um adulto emite. Isso faz parte do desenvolvimento normal.
O que realmente preocupa pais e médicos são os problemas de natureza orgânica, como a deficiência auditiva, e quando ela demonstra que não entende e não consegue se comunicar de outra forma - pois pode ser um dos primeiros sinais de autismo", explica a fonoaudióloga Ana Luiza. "Os principais fatores que são capazes de interferir no processo de desenvolvimento e reprodução da fala são surdez, doenças de faringe e laringe, autismo e uma série de outros problemas psicológicos e afetivos, como a insegurança e também a superproteção", completa o pediatra Barros.
Para evitar maiores problemas, o diagnóstico correto é de suma importância. Os exames clínicos de observação de um médico experiente, assim como a realização de exames, fazem parte desse processo. "Ainda existem as doenças que podem simular o autismo, como alguma má formação cerebral, entre outros. Por isso é importante sempre pedir os exames", confirma o neuropediatra Breinis.
Se os problemas não são diagnosticados e tratados, esses sintomas podem se estender para o período escolar, causando transtornos ainda maiores, como a repetência e a falta de vontade de estudar. "Quando existe essa falha na produção e na compreensão da fala, a comunicação estará comprometida", diz Ana Luiza. "Se esses sintomas chegam até a idade escolar, as crianças podem levar os problemas que têm na fala para a escrita. Por isso, recomenda-se procurar orientação no período pré-escolar", conclui.

Quando uma criança começa a falar, vai aos poucos aprendendo a dar significado para uma linguagem que já está interna. Ou seja, ela entende o vocabulário e depois vai tentar falar aquilo que conhece
  
Ilustração: Melissa Lagôa
O que fazer para ajudar?
Alguns problemas, infelizmente, não são possíveis evitar. Mas para auxiliar tanto no desenvolvimento da criança quanto no relacionamento com os pais, os especialistas recomendam: "Já durante a gestação a mãe deve conversar com o bebê para estimular que ele guarde uma memória da fala", instrui Barros. Isso porque "o pensamento é formado primeiro. Quando uma criança começa a falar, vai aos poucos aprendendo a dar significado para uma linguagem que já está interna. Ou seja, ela entende o vocabulário e depois vai tentar falar aquilo que ela já conhece", explica a fonoaudióloga Noemi.
Estimular a criança a conversar e não corrigi-la quando falar errado é uma ajuda para que não se iniba no começo da comunicação. Para realizar esse tipo de atividade, a desculpa da falta de tempo não é válida. Pequenas conversas na hora de dar banho - "olha a espuma, filho! Quanta espuma!", por exemplo - na hora das refeições ou de colocá-lo na cama já fazem toda a diferença. Para corrigir uma criança, "os pais nunca devem dizer que ela está errada ou repetir a palavra de forma incorreta. Quando ela disser 'au-au', os pais devem falar: 'isso mesmo, filha, um cachorro!", ensina Barros. "É péssimo para o aprendizado quando você tira o foco do que a criança está querendo explicar para como ela está explicando", confirma Noemi.
Naquela mesma noite de Natal, Juan comeu muito chocolate, brincou com os primos e se despediu dos familiares já com algumas palavrinhas a mais. Os pais não tinham dúvida de que ele se desenvolveria muito ainda. Hoje, acabou de completar 5 anos e já fala a maioria das palavras de forma correta. Aquelas que ainda não saem perfeitamente, com um pouco mais de atenção é possível compreender. Já a mamãe Noemi pôde comprovar, mais uma vez, a diferença que o estímulo e o carinho dos pais faz no desenvolvimento de um pequeno.

FONTE: Revista Viva Saúde

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